o assassinato de gonzalo
O trem atrasa. Os passageiros já embarcamos todos, mas a composição permanece imóvel, aguardando o impulso que a colocará lentamente em movimento. Um momento instável, que sempre me desperta uma fagulha de medo como a avisar que se lida aqui com forças muito além do alcance de um homem, capazes de me despedaçar em caso de distração. Para mim, uma viagem de trem sempre tem início com tal angústia, antes que eu possa me ajeitar no assento e adquirir a placidez bovina que se espera de todo passageiro. Desta vez, porém, o impulso não vem na hora marcada. Cinco, dez minutos se passam, observo a plataforma parada, partem outros trens e nada. Para passar o tempo, concentro-me nos pequenos sons do interior do vagão: o suave bater do teclado do laptop pertencente ao rapaz à minha frente, o farfalhar do saco plástico de alguém desembrulhando o lanche, os murmúrios de uma conversa entre duas moças. Um dos sons distingue-se, soberano, quase imediatamente: a voz masculina a conve...