aristarco
"À Prezada Senhorita que arruma este quarto todos os dias:
Peço desculpas por escolher este meio para falar com você (posso tratá-la por você? Tenho dificuldade, sempre chamei todo mundo de senhor e senhora, ranço de minha educação em colégio de padre antes da Revolução, a senhorita imagina como é), mas não consegui pensar em nenhum outro jeito. Estou sempre perto de minha mulher, que não me perde de vista em momento algum. Mas não podia deixar passar esta oportunidade. Desde que a vi, no primeiro dia em que aqui me hospedei, apaixonei-me por seu rosto, seu corpo. Deixou-me totalmente estupefato. Até agora lembro com carinho do sorriso que me deu ontem, quando eu e minha esposa saíamos do quarto. Fiquei pensando se estava sendo correspondido em minha afeição ou se seu treinamento exigia que você sorrisse daquele jeito para todos os hóspedes.
Gosto de pensar que não. Gosto de pensar que você me deseja, assim como eu a desejo. E a desejo. Desde que cheguei, não pensei em outra coisa.
Infelizmente, acho que minha esposa percebeu. Temos que tomar cuidado. Ela é terrível, desconfia de toda mulher que passa perto de mim. Por isso mesmo, escrevo esta cartinha trancado no banheiro, fingindo que estou evacuando. Vou deixar em cima do travesseiro antes de sair, sem que minha mulher perceba.
Vou embora amanhã. Desespero-me ao pensar que nunca mais a verei. Por isso, se corresponde aos meus afetos - e algo me diz que sim -, por favor, eu imploro, deixe uma toalha estendida na varanda. Este será o sinal. No momento em que a vê-la, contarei tudo à minha esposa, terminarei com este jogo de falsidades, e você e eu poderemos fugir daqui, juntos, sem ninguém para nos impedir. Esse é o meu sonho. Algo me diz que também é o seu.
Do teu,
Dr. Aristarco Gumercindo dos Santos"
Edivâne soltou uma gostosa gargalhada. Já presenciara muita bizarria no hotel, mas nunca vira nada semelhante quando se ofereceu para cobrir a folga da colega que limpava aquele andar. Ainda rindo, mexeu o corpo balofo em direção ao carrinho de arrumadeira para pegar uma toalhinha e depositá-la na bancada da varanda.
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