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Mostrando postagens de julho, 2018

Desafio "1001 Filmes" - no. 13 - "All That Jazz - O Show Deve Continuar" (1979)

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A arte é vaidosa por natureza: adora falar de si própria. Há uma miríade de romances que falam do fazer literário (“Dom Quixote” deve ter sido um dos primeiros livros a fazer paródia da literatura), quadros que desnudam o próprio artista (“Las meninas” de Velázquez, por exemplo) e filmes cujos protagonistas são as pessoas atrás das câmeras (Fellini em “8 1/2”, Bergman em quase toda sua cinematografia, etc.). “All That Jazz” é uma dessas obras auto-referenciais, e uma das mais especiais.  Mal-disfarçada autobiografia de Bob Fosse, lendário coreógrafo e diretor norte-americano, diretor de “Cabaret” (1972) e criador do musical “Chicago” (cuja versão cinematográfica, de 2002, venceu o Oscar de melhor filme), o filme é uma espécie de “8 1/2” ambientado no mundo dos musicais da Broadway, uma “tour de force” com formato de “roman à clef”, onde a verdade, a ficção e o sonho se chocam a todo momento com exuberância e tremenda força criativa. Joe Gideon (Roy Scheider, qu

Desafio "1001 Filmes" - no. 12 - “O Homem de Mármore” (“Czlowiek z marmuru”, 1977)

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O comunismo foi bom ou ruim? Para perguntas medíocres, respostas medíocres. Os detratores do regime que chegou a governar metade do mundo lembrarão automaticamente dos mortos nas gulags, da perseguição política e da repressão cultural. Seus defensores apontarão os avanços na educação e saúde em alguns países, no desafio ao materialismo e no apelo à fraternidade entre os povos. Mas a complexidade de um regime político não cabe no simplismo de uma resposta maniqueísta: é necessário estudar, debruçar-se sobre números, ler, discutir, antes de vociferar meias-verdades nas redes sociais. A verdade pode residir num campo ou no outro, mas certamente não está em nenhum dos extremos do espectro. O polonês Andrzej Wajda (1926-2016) era um diretor que não acreditava em respostas medíocres. Boa parte de seus filmes se debruçava sobre um assunto caro aos artistas que operavam sob o comunismo, o exercício do poder de poucos sobre a massa, e ele examinava bem as ambiguidades que acompan

pousada

tenho um hotel na beira da estrada eh mais uma pousadinha cama de palha ambiente rustico cafe da manha organico com pao de serragem e leite de gato os hipster gostam mas os negocios nao andam bem ta rolando confusao politica na cidade afasta os turistas quartos vazios uma noite chega um casal a mulher gravida em cima de um burro e eu kct deve ser refugiado sirio ou venezuelano nao deve ter um puto falei os quartos estao lotados nao quero problema com essa gente ladroes de em prego mas o cara insistiu ofereci a estrebaria podem dormir com as vaca aceitaram depois fui ver a mulher tinha dado luz a um bebezinho no meio da palha tava os cavalos as vaca os pastores tudo rezando em volta achei que tinham tomado lsd logo chegaram uns figuroes deram uns presente pro menino vendi refresco perguntei o que faziam ali e eles este eh o nosso senhor que nasceu e eu entao podem ir pra um quarto faco desconto recusaram foram embora de manha fiquei puto nem escreveram critica boa no tripadvisor nao

Desafio "1001 Filmes" - nos. 10 e 11 - “Sombras” (“Shadows”, 1958) e “Faces” (1968)

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"Sombras" ("Shadows", 1958) "Faces" (1968) Frequentemente, artistas declaram que suas obras representam uma “busca pela verdade”. Que verdade seria essa? Certamente, não é a mesma procurada pela religião ou pela ciência, por exemplo. A teologia crê num imperativo categórico, ou seja, o conceito da divindade e a transmissão deste por meio da revelação divina. A ciência, por sua vez, defende a verdade provada por argumentos racionais, conforme leis objetivas e replicáveis. A verdade da arte, ao contrários destas duas, é altamente subjetiva: possui tantos significados quanto há pontos de vista. Assim como existem infinitos pontos de vista sobre um mesmo assunto, a verdade artística seria, por assim dizer, inatingível. Para o artista, resta apenas a jornada em busca de sua verdade, que não passaria de um ponto perdido no horizonte onde duas linhas paralelas se cruzam. Para John Cassavetes (1929-1989) a verdade da arte cinematográfica resid

Desafio "1001 Filmes" - no. 9 - “A Sala de Música” (“Jalsanghar”, 1958)

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Acho que nossas lacunas falam mais de nós do que nossos feitos. Mea culpa, mea maxima culpa. Eu jamais havia assistido a um filme de Satyajit Ray (1921-1992). Não vi a trilogia de Apu. Ao que me lembre, aliás, nunca vi um filme indiano que não fosse um musical Bollywoodiano, e mesmo assim, foram poucos desses. Que bom! Ao menos, chego a essa cinematografia com o olhar inocente, sem vícios. “A sala de música” foi uma excelente introdução. Uma obra lírica, do início da carreira de Ray, produzido apenas três anos após “Pather Panchali” (1955), o primeiro da trilogia que o tornaria um diretor mundialmente famoso. É magistral a capacidade de Ray de transmitir, em meros noventa minutos e com apenas dois ou três atores em cena, sentimentos complexos como a perda de tradições numa ordem social em extinção. No roteiro, adaptado de um conto de Tarashankar Banerjee, um “zemindar” (chefe político local) de Bengala, Biswambhar Roy (Chhabi Biswas, em excelente atuação) vive em s

Desafio "1001 Filmes" - no. 8 - “Tragam-me a Cabeça de Alfredo Garcia” (“Bring Me the Head of Alfredo Garcia”, 1974)

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Carregados de mau agouro (o que os americanos chamam "foreboding"), os filmes de Sam Peckinpah fazem as tragédias de Sófocles parecerem livrinhos do Ziraldo. Está presente no clima pesado da cena, na música ameaçadora, semelhante à sensação suscitada, por exemplo, pela sequência inicial da obra-prima do diretor, “Meu Ódio Será Sua Herança” (“The Wild Bunch”, 1969): enquanto a gangue de William Holden prepara uma emboscada, alguns meninos jogam um escorpião num formigueiro, rindo enquanto o bicho esperneia. Logo nos primeiros minutos, sabe-se que a coisa toda vai acabar mal. Não se espera nada diferente de um longa cujo título é “Tragam-me a Cabeça de Alfredo Garcia”. Na primeira sequência, um poderoso estancieiro no México tortura a filha grávida diante da família para que esta confesse quem é o pai da criança. Finalmente, ela confessa, é Alfredo Garcia. Seu pai, “El Jefe”, um Hades do sul da fronteira, decreta aos seus capangas a ordem para limpar a honra da fa

Desafio "1001 Filmes" - no. 7 - "A roda" ("La roue", 1923)

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Não lembro onde nem quando assisti “Napoleão” (“Napoléon”, 1927), a obra-prima de Abel Gance e um dos maiores filmes produzidos na era muda. Lembro, isso sim, que saí extasiado do filme, não apenas pela duração (5h33) mas por seu escopo. Tudo era monumental, do discurso político às inovações tecnológicas da montagem, tudo era exibido de modo exuberante e grandioso na tela, adequado à enorme admiração que Gance, diretor intuitivo e genial, nutria pelo ditador francês. “Napoleão” é tão grande que sequer cabe num cinema normal: em sua versão original, era exibido em três telas dispostas lado a lado, formando um “cinemascope” primitivo. Há menos de um ano, vi “Eu acuso!” (“J´accuse”, 1919), o primeiro grande filme de Gance. Ali, o diretor já mostrava, ainda que com menos virtuosidade, habilidade em equilibrar a grande narrativa - a eclosão da Primeira Guerra Mundial - e a história doméstica de um triângulo amoroso. O filme é lindo, talvez o melhor libelo pacifista já produzid

Desafio "1001 Filmes" - no. 6 - "Bancando o Águia" ("Sherlock Jr.", 1924)

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Com a notável exceção de Chaplin e Jackie Chan, nunca houve gênio da comédia física como Buster Keaton (1895-1966). Conhecido na imprensa como "o homem que nunca ri", do "rosto de cera", Keaton revolucionou a "gag" visual no cinema então nascente, pulando do alto de prédios e carros em movimento, sempre com o rosto impassível como um manequim. Enquanto ele permanecia sério, a audiência ria e se assombrava com suas proezas.  Apesar de seu filme mais conhecido ser "A General" ("The General", 1926), talvez a obra que melhor resuma as habilidades de Keaton como comediante de primeira linha é "Bancando o Águia", que estrela e dirige (há relatos de que o comediante "Fatty" Arbuckle teria dirigido partes do filme). Em meros 45 minutos, em especial no terço final, Keaton realiza uma antologia brilhante das comédias rápidas de trama simples, que celebrizou nomes como Chaplin, Mack Sennett e os "Keystone Cop

Desafio "1001 Filmes" - no. 5 - "Moolaadé" (2004)

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Infelizmente, a oportunidade de assistir a filmes produzidos no continente africano é rara no Brasil. Tirando um punhado de títulos distribuídos anualmente no circuito de arte (“Comboio de Sal e Açúcar”, de Moçambique, e “A Amante”, da Tunísia, são exemplos recentes) e mostras pontuais, é quase impossível encontrar filmes do continente em cartaz por aqui. É uma grande lacuna: seria importante se familiarizar com a carreira do cinema africano e seus maiores cineastas, como o angolano Zezé Gamboa (“O Herói”, 2004), o egípcio Youssef Chahine (“Estação Central de Cairo”, 1958) e aquele conhecido como “o pai do cinema africano”, o senegalês Ousmane Sembene (1923-2007). “Moolaadé” (2004) foi o último filme dirigido por Sembene antes de falecer, uma obra feita com maturidade de mestre e leveza de artista. Ambientado numa pequena vila do interior, a história envolve Collé (Fatoumata Colibaly, cativante), que oferece proteção a um grupo de meninas para impedir que estas

Desafio "1001 Filmes" - no. 4 - "Carrie, A Estranha" ("Carrie", 1976)

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em nome do pai, do filho... Há diretores de cinema que são mestres em usar metáforas sutis para transmitir a emoção desejada em seus filmes. Em cada cena, eles conseguem transmitir grande número de símbolos à plateia, fazendo uso da caixa de ferramentas de que dispõe o artista cinematográfico: planos, movimentos de câmera, som, edição, alguma nuança na “performance” dos atores, algum detalhe na cenografia, uma pista aqui, outra acolá. Há diretores de cinema, enfim, que são mestres em persuasão ao mesmo tempo que escondem sua arte do espectador mais atento. Brian De Palma não é um desses diretores. “Carrie” foi realizado dezesseis anos após De Palma filmar seu primeiro curta, “Icarus” (1960). O diretor já tinha quilometragem, portanto, quando adaptou o romance de Stephen King, então um escritor estreante. Há domínio da técnica em “Carrie”, um ensaio do estilo maneirista que tornaria De Palma um “diretor fetiche” ao longo dos anos 80, com resultados que variam loucamente do

Desafio "1001 Filmes" - no. 3 - "Esposas Ingênuas" ("Foolish Wives") (1922)

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Para mim, aquele sujeito esquisito de monóculo, cabelo raspado à militar e com jeitão de chefe de final de fase não passava de um “character actor”, destinado a fazer tipos arrogantes como em “Crepúsculo dos Deuses” (1950) e “A Grande Ilusão” (1937). Só depois soube que Erich von Stroheim (1885-1957) foi um dos mais maiores (e mais polêmicos) diretores do cinema mudo, capaz de torrar milhões de dólares em excentricidades. E só agora inventei de ver um dos filmes que dirigiu. Hoje meio esquecido, von Stroheim foi um dos rostos mais reconhecíveis da “Era de Ouro” hollywoodiana. Nascido em Viena, seu perfil e modos aristocráticos logo o tornaram um ator calcado para papéis de vilão alemão durante a Primeira Guerra Mundial. Logo, porém, migrou para a cadeira de diretor: ficou conhecido por realizar produções luxuosas e excessivamente detalhistas, como o lendário “Ouro e Cobiça” (“Greed”, 1924), quando quase matou sua equipe ao filmar por semanas no deserto do Mojave.

racum

- Próximo. - Oi gente, meu nome é Antô... - Não estamos interessados no seu nome. Fale do projeto. Você tem sessenta segundos. - Certo! O meu game se chama "Magical Raccoon Adventure", é sobre um guaxinim... - O que é isso? - Um guaxinim é um raccoon. - Sei. - Igual ao bicho do Guardiões da Galáxia, sabe? Tem no Super Mario 3 também. - Quarenta segundos. - Ai. Então, começa o guaxinim sendo lançado de um avião em pleno voo, ele tem que surfar no ar e colecionar moedas e guarda-chuvas que são power-ups que dão armas diferentes pra matar porcos azuis que ficam voando e atirando nele de metralhadora... - O guaxinim mata os porcos? - Mais ou menos. Eles somem num peido rosa com estrelinhas. - Entendi. Continue. - A idéia é o raccoon... - Guaxinim. - Isso, a idéia é ele... - Por quê não "ela"? O animal tem um gênero definido? - Não! Pode ser ela também, sem problema. - Bota um laço rosa na cabeça dele e pronto. - Dez segundos. - Então, a idéia é ele.

Desafio "1001 Filmes" - no. 2 - "O Tango de Satã" ("Sátántangó") (1994)

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(para saber mais sobre o desafio, clique aqui ) Desvelado em exaustivas sete horas e trinta minutos, denso e arrastado, este filme deve ser uma grande experiência para assistir no cinema. Vi-o durante três ou quatro dias, no sofá de casa. Suas imagens ecoam em minha cabeça.  O diretor húngaro Béla Tarr habita uma dimensão imagética muito própria, como Kubrick e Tarkovski. Menos um diretor narrativo que visionário, seus poucos e longuíssimos planos-sequência parecem usar a história adaptada do livro homônimo de László Krasznahorkai (que assina o roteiro com Tarr) como desculpa para construir um filme que grita CINEMA em letras maiúsculas. Seus planos arrojados, que “cortam” dentro da cena (a câmera se aproxima para o “close-up”, afasta-se para um plano de paisagem, roda num “dolly” em torno dos personagens, etc.), fazem extenso uso de 100 anos do vocabulário cinematográfico, sem concessões para planos-detalhe ou o esquema cansado do plano-contraplano do cinema industri

Desafio "1001 Filmes" - no. 1 - "Kramer vs. Kramer" (1979)

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(para saber mais sobre o desafio, clique aqui ) O roteiro de “Kramer vs. Kramer” é citado frequentemente em guias para roteiristas, e é fácil ver porquê: em dez minutos de filme, os personagens estão apresentados e já se sabe pra onde a trama vai. Joanna, mãe de família, abandona o marido Ted e o filho Billy para se encontrar na vida. Os dois comem o pão que o diabo amassou para reconstruir o lar. Ted passa a dar menos atenção ao trabalho e se torna um pai mais presente e carinhoso para o filho, num arco que se tornaria comum para personagens masculinos nos dramas americanos dos anos 80. A mãe voltará no final do segundo ato para lutar pela custódia do filho, transformando o filme num drama de tribunal. Muita coisa funciona. Dustin Hoffman e Meryl Streep encarnam com maestria os papéis principais, e James Henry faz uma das melhores interpretações de um ator mirim num longa-metragem. A direção de fotografia do grande Néstor Almendros (“A História de Adél

1001 filmes para ver... e contando!

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A lista: a primeira edição de "1001 Filmes Para Ver Antes de Morrer" ("1001 Movies You Must See Before You Die", Quintessence Editions), editado por Steven Jay Schneider, foi lançada em 2003. Como o título diz, trata-se de um compêndio de 1001 obras "incontornáveis" para apreciar a arte cinematográfica mundial. A edição mais recente (a sétima) foi lançada em 2017. No total, entre títulos retirados e incluídos em edições posteriores do livro, a lista conta 1199 títulos, indo de "Viagem à lua" (1902) a "Sob a Luz do Luar" ("Moonlight", 2016). Pode ver a lista completa aqui  (em inglês). "Fala logo, Oh Dae-su, quais são seus 1001 filmes favoritos?!" Como qualquer lista, "1001 Filmes..." está repleta de lacunas. O foco - como era de se esperar de um livro dos EUA - é o cinema norte-americano em particular (567 filmes, ou seja, mais da metade dos 1001 títulos da lista de 2017 foram produzidos nos EUA) e

literatura em debate

- Bem-vindos a mais um “Literatura em Debate”. Hoje temos em nosso estúdio o escritor Lauro Pelegrino, que fala de seu novo livro, “A escuridão do abismo”. Lauro, bom dia. - Bom dia, Mônica. - E também temos a presença do crítico Prof. Hermenegildo Stompanato, que irá discutir o livro. - Bom dia.  - Lauro, minha primeira pergunta vai pra você. Como só recebi o livro ontem, e, sinceramente, tem mil e duzentas páginas, deu preguiça de ler. Li a primeira página e a última. Não entendi nada. Afinal, do que ele trata? - Mônica, o livro é basicamente um mapa afetivo de minhas memórias de infância, onde tracei, com grande esforço, toda minha trajetória emocional do berço até meus dois anos. Também é um livro de ficção científica para jovens, com grandes toques de humor. - Tem humor e o nome é “A escuridão do abismo”? - Não é humor pastelão, Mônica. - Muito bem. Vamos perguntar ao Prof. Hermenegildo o que ele achou do “A escuridão do abismo”. Espero que tenha lido. - Mônica