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Mostrando postagens de dezembro, 2010

o que eu quero da vida

- meu filho, o quê você quer da vida? - eu quero TUDO, mãe!

livro dos dias

o vivente no percurso do dia redige muitos livros. em cada fala, uma frase em cada olhar, um capítulo em cada adeus, um epílogo em cada elogio, um prefácio em cada lista, um índice em cada amor, um parágrafo. nomes, pessoas e sítios podem ser encontrados no índex on omástico ao final desta edição, junto à indicação das ilustrações. esforço-me para manter Livro dos Dias em compasso de manual, com lições que constante exigem novas edições, evitando transformá-lo em compêndio de virtudes e malefícios, ansiando que seus erros de revisão concedam-lhe o bom sentido que minhas limitações negaram. Ó Musa, afastai-nos das elegias que para nada servem, que meramente apressam o passo natural das coisas. Já carregamos Breviário de melancolias e não precisamos de Panegírico da tristeza para nos sentirmos tristes. Ao malogrado Autor, é favor que de graça e leveza utilize. Leiamos nossos livros de quando em quando, pois o dia não é tecido sozinho. Ergamos nossas

a cidade das ruas

dá-me suas almas seus operários seus perdidos seus velhos sem abrigo suas crianças felizes deixem que pisem sobre mim atravessem-me rumo a melhores dias. que ouçam as melodias que toco para elas que sintam no concreto no aço e na argila minha matéria minha imortalidade que aprendam minha poesia. que descubram meus meandros, filhos da engenharia que encontrem o amor e a angústia em minhas calçadas e esquinas que se afoguem em meus bares e se salvem em minhas igrejas. que nunca mais sintam que estão aqui por acaso fui criada apenas para criá-los, para que chorem e para que vivam para que confessem suas almas.

contúsculo (2)

Em 24 de outubro de 2009, Rogério Fagundes foi preso no aeroporto de Guarulhos, São Paulo, quando tentava embarcar num voo para Berlim com duas pistolas Glock e uma submetralhadora Uzi em sua bagagem de mão. Fagundes não possuía qualquer licença para portar as armas, as quais, conforme contou à Polícia Federal, havia adquirido de um "amigo colecionador". Protestou, por outro lado, que a exigência de porte de armas era esdrúxula perto da importância da missão que executaria na capital alemã: matar   Adolf Hitler . Segundo o depoimento, o corretor de imóveis de 43 anos, descrito por um familiar como um homem pacato e afetuoso, incumbiu-se da bizarra tarefa após assistir ao filme "Operação Valquíria", estrelado por   Tom Cruise . A obra, que narra o atentado frustrado de oficiais alemães ao   Fuhrer   em 1944, impressionou Fagundes a ponto de fazê-lo pesquisar outras tentativas para assassinar Hitler. Chamou sua atenção o fato que ninguém fora capaz de eliminar o c

poetas portugueses (1)

Florbela, Espanca-me.

adágio de domingo

eu sou muito maior do que jamais poderia ser.

contúsculo (1)

Só percebi que esse moço tava na sala quando ele gritou pedindo uma cerveja, seu juiz. - E um caldinho de feijão! - disse. - Aliás, feijão não. Tem de sururu? Dei um berro que ele pulou, quase esqueceu da cerveja. Quê que um homem estranho tava fazendo na minha sala? Moro sozinha, Meretríssimo. - Meretíssimo, minha senhora. Prossiga. - Uma gelada! - ele insistiu - Cheguei hoje de São Paulo, faz cinco anos que não bebo no meu bar favorito. Tentei explicar que o bar tinha fechado há mais de três anos e eu tinha alugado a casa, mas ele bateu o pé e fez de refém um vaso bonito que tenho em cima da mesa. - O cardápio! O cardápio!! - E o quê a senhora fez? O que eu podia fazer, seu juiz? Fui pegar uma cerveja no congelador. Vai que assim ele ia embora.

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Neste exato momento, 19h32m55s de 22 de dezembro de 2010 d.C., deste exato lugar, -8° 8' 13.67" graus de latitude e -34° 54' 8.12" de longitude, em Recife, Brasil, costa oriental da América do Sul, vejo o mar. O sol se pôs; a escuridão é combatida pela luz irradiada das lâmpadas fosforescentes instaladas em postes, além de pelos faróis que percorrem a avenida beira-mar abaixo como vagalumes indiferentes. A maré alta espirra espuma contra os muros de pedras construídos para desacelerar tanto quanto possível o avanço inexorável do mar. Vejo a cena a oito andares de altura. Pessoas caminham pelo calçadão entre a avenida e o muro de pedras. Algumas estão sentadas num quiosque de tenda branca, erguida como picadeiro, bebendo alguma cerveja ou tomando alguma sopa. Ocasionalmente, uma bicicleta cruza a ciclovia entre a avenida e o calçadão. São muitas camadas que me separam do mar, mas, neste exato momento, sinto-me perfeitamente integrado a ele, como se nele me encontrass

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eu construo minha vida como um castelo de cartas, sólido o bastante para durar o suficiente, pronto para ser demolido no instante seguinte. O vento me trouxe até aqui; e o vento me levará embora.

poema em linha reta, do pessoa

Por motivo de férias, vou postar algo meu só amanhã ou depois, que joguei pedra na cruz, hehe. Enquanto isso, deixo esse poema que é MUITO bom. Um dos da minha vida. Até breve! Poema em linha reta Fernando Pessoa (Álvaro de Campos) Nunca conheci quem tivesse levado porrada. Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo. E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil, Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita, Indesculpavelmente sujo, Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho, Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo, Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas, Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante, Que tenho sofrido enxovalhos e calado, Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda; Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel, Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes, Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,

soneto da selvageria

Por quereres que entendo desabridos, fogo se fez; em alarido. Com tantos instintos sem abrigo, a faísca abriu o inferno dos sentidos. Pululava carne! Divina danação da qual o homem não tem memória, quem lá esteve entrou para a história como um fauno cruzando o Rubicão. Os humores juntaram um oceano, os gemidos compuseram sinfonia, um grito rompeu o dia. Despertou um vizinho coreano, certo da paz matinal. Mas! Ei! Ouvia, o vaivém não se interrompia!

Karim my Friend

I´ve made a new friend today. His name is Ibrhm Karim. Mr. Karim has sent me an e-mail. Prior to this e-mail, I had no knowledge of the existence of Mr. Karim. I´m very glad he chose me as a friend, though. You might think strange I call Mr. Karim a "friend", having merely received an e-mail from him with no previous contact established between us. But I wasn´t the first one to offer friendship: read for yourself the message below and you will see he addresses me not only as a "friend", but a "good friend". And not only that: I am to him "my good friend". We belong. We are true friends. Together we can face the hardships and the cruelties of this world, for they are many and you need good friends to endure. You need family. You need love. I have friends, but true friends are always h ard to come by - and very few people close to your heart can indeed be called "friends" in the true sense of the word. These days, for someone to take

deitamos

Deitemos nesses leitos em meio à folhagem, cada um vindo de um país estranho, cada um de seu lar. Somos mesmos uns desterrados em nossa própria terra. Exilados, buscamos o chão nos olhos do outro, buscamos desesperadamente o toque gentil da areia molhada por entre os dedos, o pôr-do-sol calado por entre os morros, a gíria, o sotaque, sou para ela um experimento linguístico, examinamos nossas línguas e compomos nova gramática. Aqui, na planície escura e desabitada dos meus desejos, encontrei a sua certeza torta de deportada. Um caminho inseguro de quem não entende nada...

a noite eterna

Aqui, sob efeito das persianas e do olhar soturno dos clientes, Noite parece eterna. São 13h de um sábado ensolarado, mas o sol não foi convidado. As paredes estão pintadas de preto, e a pouca cor provém do púrpura das lamparinas e dos sofás que ladeiam as mesas, mais lúgubres ainda. Algumas pessoas pensam melhor no escuro. Outras só funcionam quando nele imerso. O jazz foi inventado em Noite. Ele quase não exerce efeito à luz do dia. O mesmo ocorre com o sexo, o roubo, o cigarro e o uísque. Seus efeitos são comprovadamente mais fracos no período entre a aurora e o crepúsculo. Naturalmente, a redução da visão em Noite aguça outros sentidos, transformando-nos em criaturas de rapina. De dia, todos são forçados a serem bons, ou fingirem sê-lo. Em Noite, os bons são devorados. Devem se esconder de animais noturnos, ou, mais comum, metamorfosearem-se em criaturas de rapina, para sobreviver. Vícios são abençoados pela escuridão. A lei e a ordem pertencem ao dia. Em Noite, são acidentes

modernidade

Chegou do expediente, finalmente. Pega o pão, fiz um ovo quente, arrasta uma cadeira e senta junto, precisamos falar certos assuntos. Te vi ontem à tardinha no Centro, quando saía do trabalho. A mão que envolvia a sua mão não era a minha. Gelei. Tanto quis te esquecer, mas ali você parecia tão feliz. Te odiei. Parei. Refleti, e decidi, digo de vez: traz ela aqui pra morar nós três!

o comprimento de onda

Vácuo que se propaga sideral, ao cosmo velho minha vida se destina. Alguém, porém, salvou-me da mortífera espiral, transportou-me a anos-luz da minha sina! Teu comprimento de onda, querida, com amplitude por mim jamais testemunhada. Singra meu espaço como de luz foste nascida, descobrindo-te em mim, muitas galáxias. As hostes digitais se acumulam pelo universo... um e zero, um e zero... ocas e surdas, a ninguém falam. Apenas tu, arquitetada com esmero, oscila-me; sons contra luzes lutam e teu analógico desvario escutam!

o retorno do átomo

Vejo na rua o protesto do povo, temeroso do retorno do átomo, a mesma força que, num átimo ameaça varrer Hiroshima de novo. Dois gigantes se olhavam por um olho, ciclopes suicidas, com tais átomos candentes. Hoje não mais: o conflito misterioso com o terror não é como antigamente. Se a ciência funde o núcleo com intenções assassinas, também move engenhos e turbinas. Cada núcleo traz em si o seu dilema: se nutre a ameaça de outras Hiroshimas também o sonho do mundo alimenta.

atrás da porta

Atrás da porta ninguém chora, nem grita como é de se esperar. Ninguém protesta, ninguém se importa, a ninguém importa quem mora atrás da porta. E quem lá vive? Sobrevive com parco pão, bebida ainda. E isso é vida? Em quê consiste? Quem inaugura a estatística? A quem o novo? Cadê o César? A quem se dá a quem é para se dar? Cadê Pilatos? Onde as mãos lavar? E quando muda? Tresandado, este percurso de querer mudar o velho o novo o inútil verso.

maneira tal

Maneira tal flor parecente flor-de-laranjeira, ramo e copo, tudo adjacente justaposto sobremaneira. Céu liquefaz; chuva, suplício e doçura, tal núpcia que sempre continua, morte doce que nunca termina. À beça; demasia; vício. de exagerar ínfimo, natural desperdício. Pára; arqueja; ânimo, suspiro. Malefício, túrgido precipício.

i want to corrupt

i want to corrupt my body in front of thee so I can sing of a new philosophy. Therefore, be not alarmed if blood seeps from my gums if blood up my throat finds a way, if my muscles fill you with dismay, the way they hang over my organs´ sway. if the cavities my face shows deepen and darken during daytime, forgive them. for they are not to be seen except in nighttime. forgive if my torso bows low over my hips, and if my hips loom over my legs, and if my legs, twisted and turned as they are, end in bony and flat feet. this crumpled and bloody body was made just for thee.

seis palavras

outro dia vi no site da Piauí ( http://revistapiaui.estadao.com.br/ ) um concurso literário para nanocontos, com até seis palavras. Cutuquei a cabeça e inventei alguns. Por uma dessas falhas imperdoáveis por parte dos jurados, resolveram não premiar nenhum dos três BRILHANTES contos que eu magnanimamente enviei à revista. Tolos. Resolvi, portanto, reproduzi-los aqui, a fim de que os julguem a história, essa insofismável juíza. POSOLOGIA Adicione ela e anão. 3 porções. GURI Mamã. Quer. Chupa. BOATE Não te conheço. Mas quero te. ENGANO Esta não é Bânia. Estefânia. BATMAN Crash. Pow. Robin, te amo. RACISMO No Brasil não tem. Tudo crioulo. TORNEIRA Jorro. Pingo. Seco. Êh a vida. GRAVIDADE Caiu pra cima. Bateu no avião. CASAL Eram pilotos. Amor a primeira pista. EGO Pára tudo: meu relógio quebrou! PERSPECTIVA Crise? perguntou o mendigo. Tudo igual. E você, por quê não escreve algum?

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eu quero ir pra casa mas não tenho mais casa, queimei a minha casa e agora o mundo se estende diante de mim. ele é grande, mas não é casa. eu posso ir pra qualquer lado. eu posso sorrir em todos os meridianos, todas as latitudes posso visitar. agora sou capaz de ver todos os rostos e cheirar todos os pescoços. mas porque isso só me lembra que não tenho mais lar? que não posso resgatar o chão de casa, o cheiro das coisas, a idade favorita, tão sentida que já passou, para não mais voltar. temo que nem cheguem perto do sol da minha infância as luzes das noites do mundo. receio que os gostos desses becos vastos empalideçam diante do sabor úmido do passado. sei que gostos se contrapõem, se sucedem e que o passado é mais fácil que o presente. mas está difícil, está difícil. * eu não quero estar aqui e quando aqui não mais estar não desejarei estar em outro lugar além daquele de onde parti. a isso chama-se saudade. isso é muito brasileiro. desejarei sentir a rua da fumaça das castanhas e as m

qualquer dor

Qualquer dor é um tormento, mas também pode ser uma grande amiga. Quando o dia se fecha em volta e eu arrisco dissolver na multidão, aquela dor familiar erupciona e exige atenção, e, aí, posso defender: "eu não sou um igual, eu tenho consequência, não sou ninguém além de mim, eu sofro desta dor e ela sofre de mim, estamos juntos e não pertencemos ao mundo, mas o mundo nos pertence..."

dia do contrário

Ele volta à casa após o trabalho. Encontra a esposa: - Tchau, amor. - beija. - Tchau! Foi ruim o trabalho? - Uma porcaria. - ele diz, sorrindo. Hoje é o dia do contrário. - Lá no escritório, o chefe não falou comigo hoje! - ela exclama. - Sério? E o que ele não disse? - Que não ganhei o aumento. - Que horror. - ele diz, e a beija novamente - Parabéns! - De nada. Com graça e ingenuidade, os dois inventaram um jogo que, durante um dia por ano, estimula a vida a dois de modo criativo e dinâmico. Algo que todo casal poderia praticar, recomendado nos últimos lançamentos de renomados especialistas em relações amorosas. O telefone toca. - Não vou atender. - ela diz, e levanta o fone. - Alô? Gradualmente, seu sorriso transforma-se num muxoxo e, daí, em desespero. - Não é uma mulher - murmura - Disse que não é sua esposa e que não quer fala r com você. Acabou a brincadeira.

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- Tô com tesão. - Amor, moça de família não fala isso... e ainda bem. Vem cá.

ontem

ontem nasci, amanhã morro. e hoje? sei lá mas a noite já chega.

pessoas

- Qual é sua pessoa preferida? - O Livro do Desassossego. Adoro. - Você não entendeu a pergunta. - Entendi perfeitamente. Só estava tentando torná-la mais interessante.