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Mostrando postagens de abril, 2011

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Escureceu agora. Últimas luzes caem sobre o ônibus búlgaro, nem deveriam ter nascido. E eu, tantas vezes mil, tantas vezes ultrapassado pelos acontecimentos, que, quando páram os carros no acostamento, junto-me a eles, para fora da possibilidade da liberdade. Deito-me e deixo-me crer mais uma vez que a mera reflexão sobre os elementos será capaz de me salvar, que a simples apreciação do crepúsculo se faz suficiente para me redimir. Prossigo, sem controle Sem controle de nada. Que venha o que me espera, A máquina do que me espera, Um descarrilamento? Que seja, que sejam as paixões e as estrelas. A frase termina no. As multidões desobedecem. As certezas se dissolvem na só. A fúria veloz dos caminhos. Pressinto: cavalgada, despedem-se lábios afoitos nas estradas. Lambem as carcaças dos pinheiros a noite fria, Vibram. Vibro? Travessia!

minha

Perdi o Rio. Ai de ti, Copacabana, e de todo o resto. Perdi o Flamengo, o Largo do Machado, a Casa Mattos ao lado do McDonald´s do Largo do Machado, o Colégio Bennett defronte à floricultura em Botafogo. Perdi chopps em noites à beira-mar em Olinda. Perdi Natal e seu mormaço. Perdi as chuvas de Brasília, as chuvas de janeiro no Sudoeste, as leituras nas manhãs chuvosas de janeiro na Biblioteca Central da Universidade de Brasília. Perdi a barca noturna da Praça XV até Charitas. Perdi chopps no Arco do Teles, na Lapa, no Gragoatá. Perdi noites estranhas em São Paulo, perdi os muros carrancudos de concreto que nunca me entenderam de São Paulo. Perdi as estrelas que se viam refletidas no Capibaribe defronte ao Teatro Apolo na Rua da Aurora. Perdi tudo isto. Mas tudo bem. Por que elas nunca me pertenceram de verdade. Se alguma vez pensei que elas me pertenciam, enganei-me redondamente. Nunca foi minha a estudante de jornalismo que roncava um bocadinho. A de direito que rosnava um po

CINEMA

Hoje, Cinema ligou. Disse que estava muito puta com meu sumiço. Tentei explicar que tive muito o que fazer nos últimos anos, trabalho, relacionamentos, morar fora e tal, e era por isso que não havíamos nos falado nos últimos tempos. - Bullshit. - respondeu, imitando Bogart. - Você já não liga a mínima pra mim faz tempo. Trepliquei com toda a doçura. Nós ainda vamos voltar, defendi. Mas eu mesmo sabia que não colava, ela me entendia, estava dentro de mim, da mesma forma que estava em 1998 durante aquelas solitárias soirèes no Recife com Murnau e Glauber, assim como estava comigo em 2003, quando viajei a Niterói e pareceu que finalmente iríamos nos casar. - Tratou-me como todas as outras. - amargou - Foi se fazendo de desentendido e, quando te chamei, já estava longe. Fiz um muxoxo e olhei pela janela do café, pois nunca sei o que dizer quando sou confrontado com a verdade. O céu de Lisboa se preparava para chorar de novo. - Mas não te enganei. - reagi, finalmente. - É fato. Mas

scrapbook (1)

if your eyes find mine in gloom and weary, ´tis because they have been apart too long from your sight. they grow weak at the remembrance of your fine, ruby eyes and the times we loved one another on the streets, carefree. no other soul to disrupt our quietude my eyes had seen: but now too many people walk between, and I do wonder if I will ever see joy again. The multitude of risks tries one´s patience immensely. those days, I used to dance with Leper women and their husbands and give immortality ponder, but this no more. and if you ever find me plunged in sadness again, why! ´tis ´cause we have parted. (30out2004)

carmela & diego

- Carmela. Estamos namorando há dois anos. Já é hora de você conhecer algumas coisas a meu respeito. - Oh não, Diego! Eu sabia, era perfeito demais pra ser verdade! Você é casado! - Eu?! Claro que não. - Então você é gay! - Também não. Apesar de, sim, eu ser incrivelmente bonito e achar o Jair Bolsonaro um gato. - Então... o que é? - Carmela, vivemos uma tórrida paixão há dois anos, mas a verdade é que você não me conhece. - Como não te conheço, Diego? Você é o homem da minha vida, é gentil, inteligente, sensível, engraçado, cheira bem, trepa bem... - Sim, sim. Mas há outros fatos que permaneceram na obscuridade e que agora serão revelados. - Outros fatos? - Exatamente. - E qual é a verdade, Diego? - A verdade é que eu sou um pulha. - Um pulha??!! - Isso mesmo. Eu não presto, Carmela. Não tenho coração. Escondi isso durante esse tempo todo, mas não posso mais continuar com esse teatro. Sou um canalha. Sempre fui. E dos grandes. Nunca respeitei as mulheres. Sempre as usei

o quadro

entrei pro quadro? entrei pro quadro! entrei, entrei pro quadro! o quadro!! o quadro!!! entrei pro quadro muito bem entrado. e agora? o que faço uma vez no quadro? onde estão as glórias, os amigos que me prometeram quando entrasse no quadro? onde estão as delícias, as picardias onde estão as estrelas fugidias, os carnavais, as malícias garantidas pelo quadro? nunca pensei que o quadro pudesse ser tão quadrado. o quadro! o quadro!! socorro! estou encalacrado no quadro! não quero mais o quadro! Me enquadraram!

as coisas dhela

Chegou Caetano à minha porta. Abracei-o como um irmão cujos pais não eram meus pais, cujo coração eu conhecera havia pouco, quatro anos somente, mas que ao longo desse tempo adquirira para mim uma importância que os corações de outros amigos mais antigos não possuíam. Larguei-o; e ele entrou, com todo o embaraço do mundo: - Tua irmã te mandou pra pegar as coisas, né? - sorri. Ele meneou, muito sério, os olhos vidrados no chão sujo. - Vem. - e o levei à segunda sala, que eu fazia de escritório. - Pus tudo o que achei dhela em duas caixas. Você aguenta levar? - Aguento. - murmurou. Observamos as duas caixas pardas, da altura de Caetano. Ele nunca conseguiria transportar aquilo sozinho. - Trouxe o carro? Balançou a cabeça. - Nesse caso, vamos no meu. - fiz menção de ir ao quarto vestir uma calça, mas ele me segurou. - Disse que não quer te ver. - Como? - Ela disse que não quer que você vá lá. - disse, ainda mais envergonhado, selecionando as palavras para que não parecessem t

conselhos certos em horas erradas

- Muito cuidado agora. É o momento mais delicado da operação. Qualquer movimento, por menor que seja, pode matá-la. E porque foi tomada por um súbito ataque de sanidade, contorceu  violentamente  o próprio corpo.