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Mostrando postagens de agosto, 2011

choque de civilizações (1)

- Brasirero tudo marandro, né? Hihihihi. - Sim, Seu Liu. - Vô ficá perto de criente, senão criente vai embora sem pagá, né? Hihihihi. - Vai tomar no cu, Seu Liu. - Brincadera, brincadera. Vai querer café? - Hoje não, obrigado. - É por conta casa. - Então eu quero. - Tá vendo? Tudo marandro! Hahahaha! - Gracinha.

um país que eu entenda

Este país não se entende, compreende, meu irmão? Este país não se entende! Por isso vou viajar pra longe, que é pra fugir deste país incompreensível, ouviu, Rodrigo? Desta esfinge! Desta charada, deste trava-línguas de 8,5 milhões de quilômetros quadrados e 191 milhões de habitantes*, desta cama-de-gato! Vou escapar, vou fugir, vou me evadir e ninguém vai se lembrar de mim, o que é ótimo porque eu não quero me lembrar do que não entendo. Vou ler o Correio Braziliense pela Internet e olhe lá. Ver as fotos nas capas dos jornais e olhe lá. Se der saudade do bolo de rolo ou da rede de dormir, mastigo qualquer coisa doce e me espreguiço num sofá. Se der saudade dela, mando buscar. Está ouvindo, né, Rudy? Não quero mais este país, dá-me dor de cabeça só de pensar! Cadê o passaporte, pr´eu rasgar? Não quero mais as angústias, o calor, o medo; quero um país cuja geografia eu possa inventar, um país fácil. Quero apreciar o verde-amarelo nas partidas da Copa e nas havaianas que ela me de

instrumentos

há instrumentos que utilizamos tão pouco que poderiam ser tão úteis: o vácuo a queda livre o silêncio a dor o espaço vazio entre os elementos que lhes dá tanto significado quanto um zero aposto ao final de um número, uma pausa numa conversa telefônica, a espuma das ondas, as ervas daninhas um gesto de amor

I refuse

no. no. no. no. no. no. no. no. no. no. I refuse. I refuse. I refuse to accept. I refuse to accept that this will be the greatest moment of my life. I refuse to accept that this will be the end of my dreams. I refuse. I deny. I deny the Gods the privilege to put me on hold. I deny the Furies the gesture that will put me to sleep  at such a tender age. I refuse. I refuse to hibernate  till the night of my death. This will not be the great act upon which my history will be written. This will not even appear in the summary of my feats. This will be merely dust. This will only prove to be the overture of my magnum opus. This will simply provide the leitmotiv for my narrative. This will just play as the theme for the jazz concert. I yet do not know what will be of me, except that that will not be this. My odyssey is far from complete. My flock has only left the shed.  The best is yet to come.

élcio

- O senhor vai se servir de novo? Élcio tomou o cuidado de falar alto o suficiente para preservar o tom de autoridade, mas baixo o bastante para que os outros clientes não o ouvissem. Era importante preservar a discrição do restaurante do Dr. Figueira. O velho empresário é tudo pra mim, pensou o garçom. - Hã? - Eu perguntei se o senhor vai se servir do bufê de novo. Longe dele causar um escândalo, se o gordinho resolvesse engrossar. - Vou, ué. Não pode? - Pela quarta vez não pode. Se ele resolvesse engrossar, Élcio o puxaria pelo colarinho e o jogaria porta fora. Mediu a massa corporal do sujeito com os olhos e duvidou que conseguiria, mas iria tentar. - Como assim? Onde é que tá escrito que não pode?! - Normas da casa. Provavelmente teria que pedir ajuda a um dos colegas. - Meu amigo, isso não faz sentido, nunca vi qualquer restaurante botar limite de vezes quantos... - Mas este não é “qualquer” restaurante, senhor. Aqui é o Figueira´s, um lugar tradicional, de bom gosto

todo mundo sabe que não se dorme depois de levar uma pancada na cabeça

- Alô? - Mãe...? - Oi, filha! Que surpresa. - Tudo bem com a senhora? - Tudo. Mas eu é que pergunto, filha. Nunca mais ligou. - Trabalho, né, mãe. A maior correria. E essa peste do Francisco, também, não me dá paz um minuto. - Não fala assim. Tudo bem com ele? - Não. - Não? Quê que ele tem? - Nem sei, mãe. Nem sei se ele tá com alguma coisa. - Como assim, filha? Fala direito. - Tô com medo. - Maria de Fátima! Pára que você está me deixando assustada. Respira fundo e me conta isso direito. O que é que o Chico tem? - Começou quando ele voltou da escola. Chegou reclamando da cabeça, que tinha batido a cabeça na hora do recreio, que tava doendo, que tava se sentindo todo mole. Fui procurar galo, ferida, né, mas nada. Botei gelo, mas não inchou. Ele, só reclamando que tava mole, com sono, e eu com medo, lógico. - Valha-me. E você foi direto pro pronto-socorro, né, Maria de Fátima. - Levei ele pro pronto-socorro. Fiquei três horas na espera, comigo segurando o saco cheio de gelo na cabeça

a dama das bromélias

Eu tinha uma colega no primeiro ano de faculdade que era muito linda, toda baixinha, magrinha, de vestido solto, que andava descalça pelos corredores do Centro de Artes e Comunicação. Dançava nos intervalos. Na primeira vez que a vi, disse comigo mesmo: quero essa mulher pra mim. Fácil falar. Eu era um playboyzinho de classe média, um dos poucos alunos a chegar de carro em universidade pública. Tímido e retraído, nunca tinha beijado uma menina. Nem pensava em me aproximar dela, a linda fã de poesia com os calcanhares sujos. E a atração permaneceu assim na maior parte do tempo, meio besto-platônica. Um dia, encontrei-a sozinha no jardim do campus, desenhando a carvão. Oi! (ênfase minha) Oi. Tá desenhando o quê? Essa bromélia. Bromélias! Minha musa bicho-grilo rabiscava bromélias! Deixei-a em seu furor artístico, certo de que pertencíamos a cantos opostos do Universo e que, tristemente, jamais nos possuiríamos. Nunca mais a reencontrei. Anos depois, eu passeava numa floricult