1001 Filmes: de 124 a 128


124) “Crisântemos tardios” (“Zangiku monogatari”, 1939)

Da tríade sagrada de diretores japoneses - Kurosawa, Ozu e Mizoguchi -, o último é o menos conhecido no Ocidente. Apesar disso, talvez seja o maior dos três. Kenji Mizoguchi (1898-1956) era uma espécie de Luchino Visconti nipônico, um esteta supremo, pouco afeito a experimentalismos narrativos como Kurosawa (que praticamente inaugurou a narrativa não-linear no cinema com “Rashomon”, em 1950), um contador de histórias à moda antiga. “Crisântemos tardios” é uma de suas primeiras obras-primas. 

Composto de longas sequências sem cortes (apenas 142, número diminuto para suas 2h30 de duração), o filme narra a história de um ator de teatro sem talento que é bajulado apenas por ser protegido de um veterano dos palcos. Ao se envolver amorosamente com uma empregada, porém, o ator se desliga de sua família e vive desventuras que o fazem amadurecer sentimentalmente. Ao final, consegue sua redenção através do sacrifício de sua amada, inaugurando a estirpe de heroínas trágicas que marcou a cinematografia de Mizoguchi.

Através dos longos planos-sequência, montados com riqueza de detalhes (alguns tem movimentos de câmera avançados para a época, como o “traveling” que acompanha o protagonista e sua amada enquanto conversam num barranco), Mizoguchi apresenta personagens complexos, conseguindo passar nuanças de suas vidas interiores sem sequer recorrer ao “close-up”.

Apesar de não ser tão genial quanto os clássicos “A vida de Oharu” (1952) e “Contos da lua vaga” (1953), “Crisântemos tardios” já mostrava o estilo humanista de Mizoguchi - marcado por seu foco na experiência humana, na incomunicabilidade entre as pessoas e nos sacrifícios que estamos dispostos a praticar em nome de alguma possível redenção -, que tornaria cada filme de Mizoguchi uma estrondosa experiência cinematográfica.



125) “A bela e a fera” (“La belle et la bête”, 1946)

O grande Jean Cocteau (1889-1963), artista francês multifacetado, realiza a melhor das adaptações cinematográficas do clássico conto de fadas. A história falsamente romântica da Bela e a Fera - que oferece farto material de estudo para psicanalistas, apresentando desde sadismo até síndrome de Estocolmo - é apresentada sob o prisma poético e onírico de Cocteau. O filme tem direção de arte impecável, refletida na maquiagem monstruosa de Jean Marais, que se desdobra para exibir humanidade sob a aparência bestial da Fera. É um belo filme, não tão ousado quanto a trilogia poética filmada pelo mestre francês (“O sangue de um poeta”, 1932, “Orfeu”, 1950, e “O testamento de Orfeu”, 1960), mas com imagens expressivas e boas atuações. 




126) “Sorrisos de uma noite de amor” (“Sommarnattens leende”, 1955)

Próximo de seu “annus mirabilis” de 1957, quando lançou os clássicos “Morangos silvestres” e “O sétimo selo”, Ingmar Bergman dirigiu esta comédia divertida sobre desencontros amorosos. Na Suécia do final do século XIX, o advogado Frederik Egerman (Gunnar Bjornstrand, ator bergmaniano, maravilhoso como o padre recalcitrante de “Luz de Inverno”, 1963) se gaba de suas conquistas amorosas, mas é posto à prova quando sua jovem esposa Anne (Ulla Jacobson) se recusa a consumar o casamento durante dois anos. Enquanto Anne se sente atraída pelo filho de Frederik, o seminarista melancólico Henrik, o advogado se envolve com uma antiga amante, a atriz Desiree Armfeldt (Eva Dahlbeck). No meio do imbróglio estão a empregada Petra (Harriet Andersson, outra atriz bergmaniana por excelência, protagonista de “Mônica e o desejo”, resenhado aqui) e um conde psicopata, Magnus (Jari Kulle).

Assim como a peça shakespereana que inspirou o título, “Sorrisos de uma noite de amor” abunda em cenas de trocas de casais, desencontros e cenas cômicas, apresentando um filme de Bergman que destoa de suas obras-primas existencialistas. Mesmo assim, é possível distinguir traços do mestre no sabor amargo que deixa o roteiro - que, entre uma picardia e outra, reflete sobre a juventude e a velhice - e na fotografia magistral de Gunnar Fischer, que, juntamente com Sven Nykvist, foi responsável pelo visual dos maiores filmes de Bergman.




127) “Satyricon de Fellini” (“Satyricon”, 1969)

Aqui temos um Fellini que, mesmo passado seu auge em “A doce vida” (1960) e “Oito e meio” (1964), ainda encontra força para encantar e impressionar o espectador com todo o excesso que aparece na tela. Adaptando as narrativas satíricas de Petrônio, escritas no início da era cristã, Fellini faz desfilar personagens selvagens que encontram deuses, jogam jogos eróticos e enfrentam a morte, numa narrativa desconjuntada mas visualmente deslumbrante. Uma cena em particular, um banquete orgiástico na casa de um patrício romano, parece ter saído da cabeça de Salvador Dalí, tão alucinantes são as imagens. Ao final do filme - que termina abruptamente, assim como o livro de Petrônio -, tem-se a impressão de que o cinema circense de Fellini era o único que poderia retratar com fidelidade os excessos profanos da Roma Antiga.




128) “Terra tranquila” (“The quiet Earth”, 1985)

Pouco conhecido, esta ficção científica australiana transmite o horror de um homem que, um dia, acorda num mundo onde todas as outras pessoas desapareceram. Até a metade do filme, vemos o sobrevivente passar por estágios como o assombro, a curiosidade e o tédio, até encontrar outras pessoas. A explicação do quê aconteceu com a Terra é curiosa, ainda que não genial. Sem caracterizar seus personagens, o filme é um experimento criativo, funcionando como um episódio estendido do seriado “Além da imaginação”. Trata-se de um pequeno clássico do subgênero de ficção cientifica pós-apocalíptica e merece ser mais visto.



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