reflexões


- Márcio, você não vai acreditar. Sabe aquela história de ter aparecido um cara dentro da sua casa, assim, do nada?
- Nem me lembre. Quase morri de susto. Eu tava lá em casa, de boa, quando o bicho apareceu na minha frente.
- Eu sei, você me contou a história.
- Tava lambendo meu rabo quando vi o tal intruso numa parede brilhante da sala. E ele também tava lambendo o rabo! Me imitando, vê se pode.
- Já ouvi a história, Márcio.
- Aí comecei a latir e o filho da puta latiu de volta, aí eu avancei, rosnando, e o cara fez a mesma coisa, e aí eu pensei, esse não vai ser fácil. Tem cara de idiota mas parece que sabe brigar. Vou acabar me fodendo. Mas aí veio meu humano e o amigo dele e os dois apartaram a gente. Foi tenso, bicho.
- Márcio. Eu. Já. Ouvi. A. História.
- Enfim. O que você queria me dizer?
- Ontem, minha humana trouxe pra casa um pedaço dessa parede brilhante que você descreveu. Adivinha o que apareceu nela?
- Um cachorro?!
- Exato. Igual a mim.
- Cacete! Deve ter uma fábrica de clones dentro dessas paredes!
- Foi o que pensei. Lógico, a primeira coisa que fiz foi latir. O fdp latiu de volta. Aí eu pulei em cima dele. Sabe o que aconteceu?
- Você deu uma dentada no rabo dele!
- Nada! Bati a cabeça com tanta força que a tal parede brilhante caiu no chão. Pensei que tinha acabado com o cara, mas, quando cheguei perto… ele tava enfiado, como que enterrado no chão, olhando pra mim.
- Que horror. Parece episódio de Black Mirror.
- Sim. Aí eu fiquei olhando pra ele, ele pra mim, estirei a língua, ele estirou de volta… e fiquei pensando. Sabe o que eu tô achando, Márcio?
- Fala!
- Acho que não é outro cachorro, não. Acho que esses cachorros que aparecem do nada são… somos nós.
- Oh! Impossível!
- Por isso eles nos imitam à perfeição. Os humanos, de alguma forma, conseguiram inventar uma parede que imita nosso mundo.
- Você enlouqueceu completamente, Fabrício. Isso não tem lógica nenhuma. Os humanos não tem a menor capacidade pra isso. Eles precisam de nossa ajuda até pra andar na rua.
- Sei que parece loucura, mas…

Fabrício sentiu o puxão de sua dona no pescoço. Percebeu que era hora de, mais uma vez, ensiná-la a voltar para casa. Despediu-se de Márcio que, incrédulo, continuou a levar seu humano na direção do Grande Lago. Queria assustar os patos e tentar esquecer aquelas idéias birutas do amigo. Uma dimensão paralela, que imita a nossa, dentro de paredes brilhantes. Vê se pode.

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