Na ponte

Eu estava andando em direção à Ponte Boa Vista, o Capibaribe mais fedorento do que de costume, quando enxerguei uma aglomeração na boca da ponte. Vi uma pequena multidão de cinquenta curiosos rodeando uma equipe de filmagem, onde, no centro, uma sorridente repórter convidava as pessoas a se aproximarem. Ao seu lado, um grande quadro branco, desses de escola, exibia um mapa-múndi do tamanho de uma pessoa.

- Quem quer tentar o desafio? Quem quer? - gritava a moça, como se vendesse banana na feira. - É muito fácil, - disse, mirando a câmera - É só acertar o país com o nome e você pode ganhar duzentos reais! Uma promoção da TV Magia!

A audiência olhava a cena, dando risinhos nervosos. Ninguém se atrevia a dar um passo à frente, então tomei a iniciativa e levantei o braço.

- Um candidato! Palmas pra ele! - exclamou a repórter, e os curiosos responderam com aplausos murchos. Em seguida, a moça explicou o jogo: a produção daria o nome de um país e eu deveria apontar sua localização no mapa.

Concordei com a cabeça. Acabei de embolsar 200 reais, pensei, tinha grande interesse por geografia e ninguém ganhava de mim em perguntas sobre países e mapas.

Depois da repórter proferir um tedioso discurso sobre a importância da leitura e da educação para o povo brasileiro, um assistente lhe passou um cartão onde estava escrito o nome do país que eu deveria localizar:

- Índia!

Tão fácil!, pensei, enquanto apontava para o grande triângulo no sul da Ásia, que correspondia ao subcontinente indiano.

- Ali? Vejamos com nossos produtores... Hã... - hesitou a apresentadora, enquanto eu imaginava, com um sorriso arrogante no rosto, o que faria com meus duzentos reais.

- Errado! - gritou a moça - Ali é a CHINA! - e o assistente escreveu, em letras garrafais, o nome sobre o território da Índia: "CHINA".

Berrei, não senhor, a China é ali, e apontei o dedo para a grande área adjacente à Índia, é impossível errar, mas a repórter já fazia tocar a música do programa, balançando a cabeça de um lado para o outro.
-
Na-na-ni-não, ali é a CHINA, não seja mau perdedor!

E a platéia, como que adestrada, deu uma sonora gargalhada e começou a gritar:

- Mau perdedor! Mau perdedor!

Ainda insisti, esperneei, mas era inútil, o assistente já me arrastava para longe do quadro, enquanto a moça repetia, sob os aplausos dos presentes, como era importante nos educarmos para aprendermos a apreciar o mundo onde vivemos.


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