calçada



Encontram-se na rua, no elevador, no bar, o lugar não importa. O que interessa são os esgares desajeitados, as frases vazias, a bagagem gigantesca de memórias que se estende atrás de um e do outro.
- Tempão, né?
- Como vão as coisas?
- Morando por aqui?
Perguntas que tentam preencher o silêncio, que eles temem demais.
- Trabalhando...
- Saindo pouco...
- Continuo solteiro...
Lembram-se de "Sinal Fechado", de Chico Buarque, e sua admoestação final, "vai abrir, vai abrir, adeus, adeus...", soando como um veredicto amargo na boca de um juiz. Ouviram a música juntos num show de Paulinho da Viola, e jamais saberão que a mesma lembrança ocorreu aos dois nesse mesmo instante.
- Bonito, esse brinco. - ele diz.
- Obrigada. - ela responde - Ganhei da minha prima.
Mentira. Ganhou dele de aniversário, há dois anos. Ela anseia que ele não se lembre. Em vão.
- E você está mais elegante. - ela solta num impulso, arrependendo-se do comentário logo em seguida.
- Obrigado.
Ele calça o sapato que ela lhe deu. Ele percebe que ela percebeu. Os dois fingem que não perceberam.
- Então é isso...
- Aparece... 
- Manda um sms...
Partem. Rumo ao emprego, ao remorso, ao oblívio, não importa.


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