- Você é um chato que escreve coisas pretensiosas que ninguém lê, que não sabe se vestir ou falar em público, que demora três meses pra ler um livro, que finge erudição quando não a tem...
(para saber mais sobre o desafio, clique aqui ) Desvelado em exaustivas sete horas e trinta minutos, denso e arrastado, este filme deve ser uma grande experiência para assistir no cinema. Vi-o durante três ou quatro dias, no sofá de casa. Suas imagens ecoam em minha cabeça. O diretor húngaro Béla Tarr habita uma dimensão imagética muito própria, como Kubrick e Tarkovski. Menos um diretor narrativo que visionário, seus poucos e longuíssimos planos-sequência parecem usar a história adaptada do livro homônimo de László Krasznahorkai (que assina o roteiro com Tarr) como desculpa para construir um filme que grita CINEMA em letras maiúsculas. Seus planos arrojados, que “cortam” dentro da cena (a câmera se aproxima para o “close-up”, afasta-se para um plano de paisagem, roda num “dolly” em torno dos personagens, etc.), fazem extenso uso de 100 anos do vocabulário cinematográfico, sem concessões para planos-detalhe ou o esquema cansado do plano-contraplano do cinema indu...
Procuro meu dono, um homem alto, cabelo claro, voz aguda e cheiro adocicado. Quando abre a boca, porém, o cheiro é de lixo molhado. Perdi meu dono há três dias, no parque grande perto do rio. Ele jogava uma bola de borracha para que eu pegasse com a boca e a trouxesse de volta, como costumamos fazer todos os domingos. Nunca soube qual a graça que isso tem pra ele, mas eu me divirto. Numa dessas vezes, fui buscar a bola e me deparei com uma linda cadelinha passeando com a dona. Tentei cheirar seu rabo e ver se tirava a barriga da miséria, mas a dona me enxotou aos pontapés. Quando voltei, meu dono tinha sumido. Deve ter achado que eu havia perdido a memória e esquecido de voltar. Vocês sabem como os humanos são idiotas. Quem encontrar meu dono, favor latir três vezes na frente da caçamba de lixo ao lado da casa rosa detrás da rua que faz muito barulho. Chamar por Hulk. Ofereço uma coxa de frango e a cabeça de uma boneca como recompensa.
Fio-me na horrenda conclusão de que eu me basto. Recuo de terror, me engasgo, ergo o mastro, estendo o picadeiro, congregando em mim mesmo meus mágicos, minha linda equilibrista sobre o cavalo, meu mestre-de-cerimônias, meus palhaços. Repentinamente, inicio o ato e não mais me encontro. Distante da tenda, os ventos uivam para além da música, para além do carnaval e da picardia, do sorriso das crianças, da pipoca. Um deserto me assombra em torno dessa ilha de alegria. Infindas paragens. Desmonto a tenda. O circo viaja ao redor das devolutas paisagens, meninos desgarrados juntam-se à caravana, velhos trapezistas são deixados à beira da estrada. O engolidor de facas se amasia com a mulher barbada e abandonam o ato, muitos outros se intercambiam nessa nau dos insensatos, e tudo em mim. Circo de mim caminha. À noitinha, inicio o espetáculo, combatendo os holofotes a treva densa, a fanfarra contra a paz de tudo o que é morto, a algazarra dos santos beberrõ...
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