jujuba



Estêvão ocupava um alto cargo administrativo na Coelho & Coelho Associados. Ganhava bem e tinha direito a um escritório com banheiro. Um dia, porém, um amigo deu o alerta: sua posição estava a perigo. Seu departamento não estaria produzindo tanto quanto a diretoria gostaria, e já se pensava em botar Estêvão no olho da rua.

A profecia do colega parecia se concretizar nos dias seguintes. De uma hora para outra, os outros diretores pararam de responder às ligações de Estêvão. Também nunca conseguia marcar uma reunião sequer, sempre ouvindo desculpas, um chefe estava doente, o outro tinha uma viagem marcada para aquele mesmo dia. Apavorado, Estêvão percebeu que seu processo de fritura começara.

Pediu conselhos ao amigo que o alertara da desgraça. Muito solícito, este tinha engendrado um plano.

- É uma chance em um milhão, mas pode dar certo.

- Desembucha!

- Você tem um cachorro, não?

Estêvão achou engraçada a pergunta, mas confirmou, sim, possuía uma cocker spaniel de nome Jujuba.

- Então. - prosseguiu o amigo - Próximo domingo, a empresa organiza um piquenique com todos os funcionários. O velho Coelho estará lá, e sei, por fonte fidedigna, que ele é louco por cães. Louco mesmo, do tipo apaixonado. Então, leve sua cachorra pro piquenique e faça de tudo pro velho notá-la. Vai que você consegue se aproximar dele e falar duas ou três palavras sobre seu emprego... daí, é cruzar os dedos.

Estêvão achou a idéia tão absurda que poderia funcionar. No domingo seguinte, apareceu no piquenique com Jujuba a tiracolo. A linda cachorrinha arrancava suspiros por onde passava, e ninguém resistia em lhe fazer festinha.

Quando se aproximou de um grupo de diretores, porém, este se dispersou de imediato. Estêvão percebeu que sua última esperança seria apelar diretamente ao presidente da empresa.

Viu o Sr. Coelho conversando com um vice-presidente. Respirou fundo e, fingindo casualidade, passou ao lado do velho com Jujuba na coleira.

Seu coração deu um salto quando ouviu uma exclamação:

- Que linda! Que simpática!

Era o velho, que se ajoelhou na grama e começou a acariciar incessantemente o pêlo dourado da cocker. Estêvão, sorrindo de orelha a orelha, travou conversa com o empresário, que, por sua vez, caiu de amores pela cachorra.

Ao longo da tarde, Coelho nada mais fez além de brincar com Jujuba: corriam de um lado para o outro, ele atirava uma bola para que ela a buscasse, rolavam pela grama abraçados, a cadela a lamber-lhe o rosto com vontade. Os funcionários observavam o curioso par. Estêvão, apesar de não ter conseguido um minuto para falar de sua situação, dizia a si mesmo que o velho jamais consentiria, de qualquer modo, que demitissem o dono de animal tão adorável. Mesmo ao se despedirem, Coelho beijou o focinho da cadela e disse ao seu dono:

- É estupenda! Quero vê-la mais vezes!

Estêvão garantiu que a levaria ao escritório. À distância, os diretores espumavam de raiva, entre a fúria e a inveja.

Não precisavam se preocupar. Na manhã seguinte, Estêvão chegou ao escritório apenas para ouvir de sua secretária, terrivelmente constrangida, que ele havia sido demitido e que um substituto já ocupava seu lugar.

Quase caiu pra trás. Ofegante, perguntou à moça se o substituto estava em sua sala. Ao ouvir que sim, correu para a porta, abrindo-a furiosamente antes que a secretária pudesse impedi-lo.

Sentada atrás da mesa, trajando uma elegante gravata em torno do pescoço peludo, Jujuba tinha as patas sobre uma pilha de documentos. Latiu alegremente ao se deparar com o dono, agora convertido numa estátua de cera.





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