1001 Filmes: de 119 a 123
119) "Blow-up - depois daquele beijo" ("Blow-up", 1966)
Depois de despontar na cinematografia internacional com a genial "trilogia da incomunicabilidade", Michelangelo Antonioni foi levado pelo produtor Carlo Ponti a Londres. Tratava-se de um cenário bem diferente da romântica e decadente Itália da "dolce vita" que Antonioni havia filmado até então. Ambientado na "Swinging London" dos anos 60, "Blow-up" se assemelha a uma cápsula do tempo da contracultura, com discotecas, minissaias, carros velozes pela rua e a juventude dourada buscando sexo e agitos.
A introspecção do mestre italiano, de alguma forma, não combina com o cenário nem com seu protagonista, David Hemmingway, que interpreta um fotógrafo de moda mulherengo que se depara com a investigação de um crime. O contraponto de Hemmings é a maravilhosa Vanessa Redgrave, que rouba todas as cenas onde aparece.
A introspecção do mestre italiano, de alguma forma, não combina com o cenário nem com seu protagonista, David Hemmingway, que interpreta um fotógrafo de moda mulherengo que se depara com a investigação de um crime. O contraponto de Hemmings é a maravilhosa Vanessa Redgrave, que rouba todas as cenas onde aparece.
Antonioni traz uma reflexão interessante sobre o poder da imagem em criar narrativas (metáfora, afinal de contas, do próprio cinema). A habilidade do mestre em retratar o erótico também está sempre em evidência. Essas qualidades, porém, acabam diluídas em intermináveis sequências de sessões de fotografia de moda e na câmara escura de Hemmings, um protagonista inexpressivo. O resultado é um filme desconjuntado, com boas cenas mas que funciona mais como uma tediosa "performance" artística do que um filme maduro. Poucos anos depois, Antonioni teria mais sucesso artístico (e menos comercial) com "Zabriskie Point" (resenhado aqui).
120) "Laços de ternura" ("Terms of endearment", 1983)
Trilhando o filão de dramalhões familiares inaugurado com "Gente como a gente" (1980), "Laços de ternura" estabeleceu um formato popular de melodrama nos anos 80. Com a trama centrada na relação entre uma mãe (Shirley MacLaine) e sua filha (Debra Winger), a história retrata vários anos em que as duas passam por transformações afetivas, desde a paixão entre a mãe e seu vizinho (Jack Nicholson), até o casamento frustrado da filha e a subsequente doença terminal desta, que reconciliará a família e amigos próximos.
Contando com uma longa carreira como roteirista de televisão, James L. Brooks sabia capturar a atenção do espectador, criando empatia instantânea com seus personagens. Essa habilidade é evidente em "Laços de ternura", sua estreia como diretor no cinema. Em poucos diálogos, os personagens ficam estabelecidos, são coerentes com sua personalidade e com um arco claro. Infelizmente, isso também faz com que o filme seja muito "certinho", com cenas meticulosamente preparadas para arrancar lágrimas ou risos do espectador. Como na maioria das novelas televisivas, Brooks não deixa espaço para experimentalismo, o que "sufoca" o filme. Como retrato das mudanças dos papéis familiares nos anos 70 e 80, "Kramer vs. Kramer" (resenhado aqui) faz um trabalho melhor. De qualquer maneira, "Laços de ternura" conta com trunfos, como a atuação luminosa de MacLaine e o carisma de Nicholson. O filme consolidou a carreira de Brooks ao vencer o Oscar de melhor filme, diretor, atriz, ator coadjuvante e roteiro adaptado. Anos depois, seria um dos criadores de outra grande produção sobre relações familiares, “Os Simpsons”.
121) “O grande hotel Budapeste” (“The grand hotel Budapest”, 2014)
Os filmes de Wes Anderson são como aqueles bolos de festa enfeitados com massa cor de rosa e glacê por cima: parecem uma delícia, mas o sabor não é lá essas coisas. Um triunfo da forma sobre substância, “O grande hotel Budapeste” funciona como filme leve de aventuras mas está longe de merecer admiração por outros aspectos além da direção de arte e da performance de Ralph Fiennes, excelente no papel principal.
Os demais bons atores, como Adrien Brody, Tilda Swinton, Edward Norton e Willem Dafoe, são desperdiçados em pontas de luxo, sem que tenham chance de aprofundar seus personagens; a história do concierge de hotel que é falsamente acusado de um crime para receber a herança de uma ricaça é desnecessariamente rebuscada; e o formalismo extremo de quase todas as cenas, com movimentos de câmera milimétricos para todas as direções e diálogos cronometrados, afasta mais do que aproxima o espectador da história. Temos a sensação de ler um livro infanto-juvenil de mistério, com aquelas abas que você puxa para revelar personagens se ocultando detrás da página. Surpreende, mas é bobinho.
Em outros filmes seus, como “Os excêntricos Tenenbaums” (2001) e “A vida aquática” (2004), Anderson conseguiu equilibrar apuro técnico com a criação de empatia pelos personagens. Infelizmente, não foi o caso em “O grande hotel Budapeste”.
122) “Trens estreitamente vigiados” ("Ostre sledované vlaky", 1966)
Vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro em 1968 e filiado à chamada “nouvelle vague tcheca”, como “O baile dos bombeiros” (1967, ver resenha aqui) e “As pequenas margaridas” (1966, aqui), “Trens estreitamente vigiados” é uma comédia satírica, de produção modesta e roteiro inteligente. Através da história de Milos Hrma, jovem ocioso que consegue emprego na estação ferroviária de uma cidadezinha durante a ocupação nazista, o diretor Jirí Mendel ridiculariza a burocracia e a pequena burguesia tcheca, expondo a hipocrisia das relações sociais e o desejo sexual latente que reina na sociedade.
Desde a sequência inicial, em que Milos descreve seu avô mágico, que morreu tentando parar os tanques nazistas com a força da mente, e seu pai, cujo maior feito foi se aposentar cedo, o diretor exibe a incapacidade do homem moderno de fazer alguma diferença diante dos fatos históricos que se desenrolam ao seu redor. Milos será um personagem exemplar nesse campo, politicamente alienado, mais interessado em perder a virgindade com alguma das moças que cruzam seu caminho do que se juntar à resistência popular contra os nazistas. No final, conseguirá a redenção.
Uma das cenas mais marcantes do filme é aquela na qual um colega de trabalho de Milos seduz uma moça do campo. Lentamente, ele marca sua pele com carimbos da estação, como se escrevendo a burocracia estatal em seu corpo. É uma crítica potente ao Estado, característica da “nouvelle vague tcheca” que teria fim dois anos após o lançamento do filme, com a invasão dos tanques soviéticos na “Primavera de Praga” e a instalação da ditadura socialista na Tchecoslováquia.
123) “Chantagem e confissão” (“Blackmail”, 1929)
Primeiro filme sonoro britânico, “Chantagem e confissão” foi dirigido pelo então promissor Alfred Hitchcock, que já tinha quase dez títulos mudos no currículo. Apesar de não ser dos melhores de sua filmografia, este suspense já mostra traços que tornariam “Hitch”, décadas depois, num dos mestres incontestáveis do cinema: o tema recorrente da pessoa comum em apuros (no caso, a personagem interpretada por Anny Ondra, que é chantageada por um desconhecido após matar um homem em legítima defesa); a perseguição climática (aqui, ocorrida no Museu Britânico); e a ambiguidade moral dos personagens, no caso, por exemplo, do noivo da moça (interpretado por John Longden), um policial dividido entre cumprir seu dever e denunciar a amada. Uma cena tipicamente “hitchcockiana” é a caminhada da mulher pelo centro de Londres, onde ela vê, em todos os cantos, a lembrança de seu crime, numa demonstração de que “Hitch” já gostava de explorar o lado psicológico de seus personagens.
Mesmo não sendo um clássico, “Chantagem e confissão” mostra prenúncios do gênio que dirigiria “Um corpo que cai” (1954) e “Psicose” (1960).
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